21/11/2022

 

PRESENTE E FUTURO - 6 - Direitos Sociais de Volta - Educação

 

Educação constrói o indivíduo e a sociedade[1]. É parte do discurso político, sobretudo o eleitoral. Esta característica de “discurso eleitoral” carrega o significado de palavra oca de prática. A ação em favor da construção do indivíduo cidadão exige a valorização da prática diária em favor da Educação. E isto pressupõe muito mais do que um cidadão informado; é preciso um cidadão formado.

O primeiro documento a se examinar aqui, além dos dispositivos constitucionais que abordam a questão da Educação[2], é o Plano Nacional de Educação (PNE). Em sua Apresentação, lê-se:

A Emenda Constitucional nº 59/2009 (EC nº 59/2009) mudou a condição do Plano Nacional de Educação (PNE), que passou de uma disposição transitória da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/1996) para uma exigência constitucional com periodicidade decenal, o que significa que planos plurianuais devem tomá-lo como referência. O plano também passou a ser considerado o articulador do Sistema Nacional de Educação, com previsão do percentual do Produto Interno Bruto (PIB) para o seu financiamento. Portanto, o PNE deve ser a base para a elaboração dos planos estaduais, distrital e municipais, que, ao serem aprovados em lei, devem prever recursos orçamentários para a sua execução.[3]

É comum se encontrar quem restrinja a dimensão da Educação a uma preparação para a inserção do indivíduo no mundo do trabalho. É indiscutível, conforme comentado em artigo desta série dedicado ao direito ao Trabalho[4], a importância deste para o indivíduo pelo fato de permitir que ele encontre um sentido para a vida, conquista muito além daquela de meio de obtenção de recursos para a sobrevivência. Esses recursos são gerados a partir da dependência criada por uma relação de assalariamento ou do desempenho de atividades de forma autônoma.

Um marco fundamental para que o país tivesse um Plano Nacional de Educação foi a Conferência Nacional de Educação - CONAE 2010[5]

Na plataforma de campanha de uma ampla coligação para as eleições de 2022, podem ser encontradas as principais prioridades para a área da Educação. Trata-se, ao mencioná-las, de focar medidas sobretudo restauradoras de políticas que vinham sendo executadas nos anos anteriores ao Golpe de 2016, que veio a se transformar num período de ultraliberalismo econômico e protofascismo crescente[6].  Elas podem ser apresentadas assim:

a)      a implantação de creches e ensino em tempo integral para melhorar a qualidade da educação e da vida das crianças, jovens e de suas famílias;

b)       o acesso à Internet de qualidade em todo o país para conectar essas crianças, jovens e famílias;

c)      ampliar o acesso dos jovens ao curso superior, com: o fortalecimento dos programas implantados há alguns anos – ENEM, PROUNI e FIES; expansão e fortalecimento da Lei de Cotas Raciais e Sociais; e implantação do programa Bolsa Permanência, para permitir que estudantes de baixa renda permaneçam na universidade.

É oportuno mencionar que duas dessas prioridades – a merenda escolar e a Bolsa Permanência – estão relacionadas, em parte, com a maior prioridade a ser enfrentada pelo governo eleito em 2022: a fome e outras formas menos graves de carência alimentar.

Na perspectiva de médio e longo prazo, incluindo-se, portanto, períodos quadrienais de governos além do próximo, cabe, no exíguo espaço deste texto, listar nos parágrafos seguintes, abreviadamente, as 20 metas do Plano Nacional de Educação – PNE. Registrem-se a criação em 2014 e a interrupção, com o golpe[7], de um processo de monitoramento da execução do Plano[8].

META 1 – Universalização, até 2016, da educação infantil na pré-escola, para idades especificadas, e ampliação da oferta de educação infantil, para atender no mínimo 50%, até o final da vigência do Plano (junho de 2024).

META 2 - Universalização do ensino fundamental de 9 (nove) anos para toda a população de 6 (seis) a 14 (quatorze) anos e garantia de que pelo menos 95% (noventa e cinco por cento) dos alunos concluam essa etapa na idade recomendada, até o último ano de vigência do PNE.

META 3 - Universalização, até 2016, do atendimento escolar para toda a população de 15 (quinze) a 17 (dezessete) anos e elevação, até o final do período de vigência do PNE, da taxa líquida de matrículas[9] no ensino médio para 85% (oitenta e cinco por cento).

META 4 – Universalização do acesso à educação básica e ao atendimento educacional especializado para a população de 4 (quatro) a 17 (dezessete) anos, com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação.

META 5 – Alfabetização de todas as crianças, no máximo, até o final do 3º ano do ensino fundamental.

META 6 – Oferta de educação em tempo integral em, no mínimo, 50% das escolas públicas, de forma a atender, pelo menos, 25% dos alunos da educação básica.

META 7 - Fomento da qualidade da educação básica em todas as etapas e modalidades, com melhoria do fluxo escolar e da aprendizagem de modo a atingir as médias nacionais para o Ideb.

META 8 - Elevação da escolaridade média da população de 18 a 29 anos, de modo a alcançar, no mínimo, 12 anos de estudo no último ano de vigência do Plano, para as populações do campo, da região de menor escolaridade no País e dos 25% mais pobres, e igualdade da escolaridade média entre negros e não negros declarados à Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE.

META 9 - Elevação da taxa de alfabetização da população com 15 anos ou mais para 93,5% até 2015 e, até o final da vigência do PNE, erradicação do analfabetismo absoluto e redução em 50% da taxa de analfabetismo funcional.

META 10 – Oferta, no mínimo, de 25% das matrículas de educação de jovens e adultos, nos ensinos fundamental e médio, na forma integrada à educação profissional.

META 11 - Triplicação das matrículas da educação profissional técnica de nível médio, assegurando a qualidade da oferta e pelo menos 50% da expansão no segmento público.

META 12 - Elevação da taxa bruta de matrícula[10] na educação superior para 50% e da taxa líquida para 33% da população de 18 a 24 anos, assegurada a qualidade da oferta e expansão para, pelo menos, 40% das novas matrículas, no segmento público.

META 13 - Elevação da qualidade da educação superior e ampliação da proporção de mestres e doutores do corpo docente em efetivo exercício no conjunto do sistema de educação superior para 75%, sendo, do total, no mínimo, 35% doutores.

META 14 – Elevação gradual do número de matrículas na pós-graduação stricto sensu, de modo a atingir a titulação anual de 60.000 (sessenta mil) mestres e 25.000 (vinte e cinco mil) doutores.

META 15 - Garantia, em regime de colaboração entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, no prazo de 1 (um) ano de vigência deste PNE, de política nacional de formação dos profissionais da educação de que tratam os incisos I, II e III do caput do art. 61 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, assegurado que todos os professores e professoras da educação básica possuam formação específica de nível superior, obtida em curso de licenciatura na área de conhecimento em que atuam.

META 16 - Formação, em nível de pós-graduação, de 50% (cinquenta por cento) dos professores da educação básica, até o último ano de vigência deste PNE, e garantia a todos os profissionais da educação básica formação continuada em sua área de atuação, considerando as necessidades, demandas e contextualizações dos sistemas de ensino.

META 17 - Valorização dos profissionais do magistério das redes públicas de educação

básica, de forma a equiparar seu rendimento médio ao dos demais profissionais com escolaridade equivalente, até o final do sexto ano de vigência deste PNE.

 

META 18 - Garantia, no prazo de 2 (dois) anos, da existência de planos de carreira para

os profissionais da educação básica e superior pública de todos os sistemas de ensino e, para o plano de carreira dos profissionais da educação básica pública, tomar como referência o piso salarial nacional profissional, definido em lei federal, nos termos do inciso VIII do art. 206 da Constituição Federal.

 

META 19 - Garantia de condições para, no prazo de 2 (dois) anos, a efetivação da gestão democrática da educação, associada a critérios técnicos de mérito e desempenho e à consulta pública à comunidade escolar, no âmbito das escolas públicas, prevendo recursos e apoio técnico da União para tanto.

META 20 - Ampliação do investimento público em educação pública de forma a atingir, no mínimo, o patamar de 7% (sete por cento) do Produto Interno Bruto (PIB) do País no 5º (quinto) ano de vigência desta Lei e, no mínimo, o equivalente a 10% (dez por cento) do PIB ao final do decênio.

Aí está uma breve síntese do desafio para melhorar o futuro do país nas próximas décadas! Tudo depende de que parte da população se conseguirá mobilizar na execução das tarefas.

 

ANEXO

A EDUCAÇÃO na Constituição, segundo o Índice Temático constante da sua versão compilada (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/ConstituicaoCompilado.htm), acesso em 08/11/2022.

* acesso/ competência comum – art. 23, V – trabalhador adolescente; garantia – art. 227, § 3o, III

* ambiental; promoção – art. 225, § 1o, VI

* analfabetismo; erradicação – art. 214, I e ADCT art. 60, § 6o 

* bolsas de estudo; ensino fundamental e médio – art. 213, § 1o

* Colégio Pedro II; órbita federal – art. 242, § 2o

* dever/ do Estado – art. 205 e art. 208 – da família – art. 205

* direito/ social art. 6o – de todos – art. 205

* ensino/ acesso; direito subjetivo – art. 206, I, e art. 208, V e § 1o – gratuidade em estabelecimentos oficiais; exceção – art. 206, IV e art. 242, caput – valorização dos profissionais – art. 206, V  – garantia de qualidade – art. 206, VII – fundamental; obrigatório e gratuito – art. 208, I  – médio; universalização progressiva e gratuidade – art. 208, II – noturno; oferta regular – art. 208, VI – fundamental; programas suplementares de atendimento – art. 208, VII – religioso; matrícula facultativa – art. 210, § 1o – língua portuguesa – art. 210, § 2o 

* escolas públicas, comunitárias, confes­sionais ou filantrópicas; requisitos para recebimento dos recursos públicos – art. 213 e ADCT art. 61 

* instituições sem fins lucrativos; impostos; vedação – art. 150, VI, “c” e § 4o

* liberdade e pluralismo – art. 206, II e III

* magistério público/ plano de carreira – art. 206, V – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério – ADCT art. 60

* nacional; diretrizes e bases; competência privativa da União – art. 22, XXIV

* professores/ acumulação de cargos – art. 37, XVI, “a” e “b” – aposentadoria/ servidores públicos – art. 40, §§ 1o e 5o – segurados da previdência social – art. 201, §§ 7o e 8o e EC 20/98, art. 9o 

* professores; nível superior; estabilidade; não-aplicabilidade da hipótese – ADCT art. 19, § 3o 

* salário-mínimo; atendimento às necessidades – art. 7o, IV

* Serviço Nacional de Aprendizagem Rural – ADCT art. 62

* União, ou Estados, ou Distrito Federal, ou Municípios [ente ou entes federados]; ensino/ competência concorrente; legislação – art. 24, IX – observância do mínimo da receita de impostos na manutenção e desenvolvimento – art. 34, VII, – sistemas – art. 211  – fundamental; aplicação de recursos;  programas suplementares; fontes adicionais de financiamento – art. 212 e ADCT art. 60  – programas de educação pré-escolar – art. 30, VI – plano nacional de educação; melhoria de qualidade – art. 214, III – vinculação de parcela da receita a entidades – art. 218, § 5o – História do Brasil; ensino – art. 242, § 1o 

* universidades/ autonomia – art. 207, caput – pesquisa e extensão; apoio financeiro – art. 213, § 2o – professores, técnicos e cientistas estrangeiros; admissão – art. 207, §§ 1o e 2o 

 

 

Agradecimento: o autor deste artigo agradece as valiosas observações feitas por Eneida Orenstein Ende e Maria Isabel Pedrosa à versão preliminar apresentada a elas, mas, é claro, isenta as colaboradoras por falhas remanescentes na versão final, da responsabilidade do autor.



[1] Vem sendo publicada no blog https://brasilcomdemocracia.blogspot.com, uma série de artigos, especialmente dedicados aos 11 "direitos sociais" mencionados no artigo 6º da Constituição Federal. Este, relativo à Educação, é o sexto artigo da série.

São os seguintes os 11 direitos que estão sendo abordados nesta série, em ordem diferente daquela em que estão especificados na Constituição: Saúde, Alimentação, Trabalho, Moradia, Educação, Transporte, Segurança, Previdência Social, Proteção à Maternidade e à Infância, Assistência aos Desamparados e Lazer. O autor deste artigo, buscou ordená-los segundo o critério da urgência no atendimento das necessidades, nesta primeira metade da década de vinte do século XXI, embora reconheça a dificuldade de fazer o ordenamento dos direitos para abordagem deles, pela interdependência que eles apresentam.

 

[2] Encontram-se em um anexo deste artigo as ocorrências do tema Educação no texto constitucional. É indispensável destacar o artigo 214 da Lei nº 13.005/2014. Ver em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l13005.htm

 

[3] “Planejando a Próxima Década; Conhecendo as 20 Metas do Plano Nacional da Educação”. Ministério da Educação, 2014. Disponível em https://pne.mec.gov.br/images/pdf/pne_conhecendo_20_metas.pdf

 

[5] “CONAE 2010 - Conferência Nacional de Educação; construindo o Sistema Nacional Articulado de Educação: o Plano Nacional de Educação, Diretrizes e Estratégias de Ação (Documento final)”, Ministério da Educação. O artigo 2 desta série abordou a questão da participação social na formulação das políticas públicas: https://brasilcomdemocracia.blogspot.com/2022/05/presente-e-futuro-2-mecanismos-da.html

 

[6] Essas e as medidas em outras áreas podem ser encontradas em: https://lula.com.br/propostaslula13/.

 

[7] Essa palavra “Golpe” é sempre referida ao simulacro de impeachment realizado em 2016, tendo em vista que não foi confirmada a prática de crime de responsabilidade pela Presidenta eleita em 2014.

 

[8] http://fne.mec.gov.br/noticias-fne/152-relatorio-do-2-ciclo-de-monitoramento-das-metas-do-pne-2018. 15 páginas. Ver também “Brasil. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Plano Nacional de Educação - PNE 2014-2024: Linha de Base”. – Brasília, DF: Inep, 2015. 404 p.: il. Disponível em: https://download.inep.gov.br/publicacoes/institucionais/plano_nacional_de_educacao/plano_nacional_de_educacao_pne_2014_2024_linha_de_base.pdf. Este documento “consiste em análises descritivas das

séries históricas dos indicadores. As informações foram extraídas dos dados provenientes das pesquisas do Inep (Censo da Educação Básica, Censo da Educação Superior, Saeb e Ideb), do IBGE (Pnad e Censo Demográfico) e da Capes (dados da pós-graduação), disponíveis na data de promulgação da Lei do PNE, em 25 de junho de 2014. Este documento tem como objetivo desencadear o debate a respeito dos indicadores mais adequados para o acompanhamento das metas estabelecidas no Plano."

 

 

 

[9] “Taxa Líquida de Matrículas” é a razão entre as matrículas de estudantes de determinada faixa etária e a população total daquela faixa.

[10] “Taxa Bruta de Matrículas” é a razão entre o número total de matrículas (independente da faixa etária) e a população correspondente na faixa etária prevista. No ensino superior, por exemplo, essa faixa etária é 18 a 24 anos. 

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