PRESENTE
E FUTURO - 1 - DIREITOS SOCIAIS DE VOLTA! ALIMENTAÇÃO
É
difícil estabelecer uma ordem de prioridade para enfrentamento das carências
relacionadas com os 11 direitos sociais listados na Constituição Federal (art.
6º). Escolhemos a alimentação para iniciar uma sequência
de textos sobre cada um desses direitos. Ver e .
Os
dois primeiros artigos publicados desta série serviram para colocar
questões de grande significado ao se falar em “Reconstrução do país”. A escolha dos direitos
sociais – seja a restauração dos eliminados durante o período 2016-2022, seja a
ampliação dos remanescentes –, para dar sequência à abordagem das tarefas
urgentes, dispensa justificativas, porque se trata de colocar em debate a
dignidade de imensa maioria dos brasileiros que sobrevivem em condições ínfimas
considerando-se as necessidades básicas.
O
direito à alimentação leva, inicialmente, a destacar que ele não se apresenta
como direito para a parcela da população cuja renda permite a aquisição dos
alimentos no mercado. Trata-se de uma relação do direito à alimentação com o
direito ao trabalho e, por consequência, à renda, capaz de proporcionar, ou não,
o atendimento da necessidade fundamental ao alimento. Poderíamos dizer que se
trata de uma “necessidade básica”, como as demais que levam os cidadãos com
maior renda ao mercado; sem esquecer que este “cria necessidades”, neste e em
outros segmentos, por meio de cada vez mais sofisticada publicidade, levando ao
desperdício de recursos naturais e até a problemas graves de saúde.
Mas,
para aqueles cuja renda decorre do trabalho ou, na ausência deste, de uma
“renda básica de cidadania” ou denominação similar, o temido fenômeno
macroeconômico da inflação se coloca como capaz de ampliar a dificuldade de
acesso pleno, de todos, a esse direito.
O
papel da renda no atendimento das necessidades relativas aos vários direitos
sociais põe em destaque – enquanto a sociedade não substitui o modo de produção
capitalista por outro – o conjunto das políticas econômicas capazes de produzir
um ambiente de boas expectativas de investimentos e, portanto, de criação de
emprego e renda.
A
importância desse conjunto de políticas econômicas se justifica pelo caráter de
instabilidade do Capitalismo, pois as decisões privadas de investimento se
baseiam não somente na garantia de segurança dos negócios, mas também na
criação, pelo Estado, de planos de investimento e alocação de recursos públicos
ou empréstimos, destinados ao setor privado (lucrativo ou não) com condições de
pagamento e juros compatíveis com o prazo de alcance dos resultados da produção
almejada.
Pensemos
agora no direito à alimentação tendo em vista os mecanismos de oferta e demanda
dos alimentos. Conforme dito acima, parcela maior da população tem condições de
tratar a disponibilidade de alimentos com a renda que obtém regularmente. Ou
seja, essa necessidade fundamental pode ser atendida pelos ajustes de oferta e
demanda existentes no mercado; excetuam-se, no entanto, aspectos em que a
presença do Estado é indispensável: o controle da qualidade dos alimentos e a
prestação de informações mínimas sobre conteúdos nutricionais para todos os
indivíduos (considerados sexo, idade etc.). Além disto, algumas medidas são
fundamentais para o atendimento dessa disponibilidade, pois o mercado – movido
essencialmente pelo interesse do lucro – não é capaz de atender:
a) a oferta de crédito subsidiado (ou
seja, custo reduzido em relação ao de mercado) que garanta a produção;
b) outros apoios e estímulos à oferta
(como, a título de exemplos: assistência técnica; formação de pessoal para essa
assistência; e medidas de apoio à produção com a aquisição dos produtos para merenda
escolar, gerando um mercado para essa produção);
c) a manutenção de estoques
reguladores – que demandam recursos para a infraestrutura de estocagem e
transporte;
d) uma política tributária –
resultante de esforços das três esferas da Federação, diante das competências tributárias
que lhe são próprias – que compense a pressão dos custos sobre os preços dos
alimentos. É claro que a lista de alimentos deverá levar em conta a
participação no orçamento das classes de renda familiar, tornando maiores as
reduções de impostos – inclusive ao valor zero – para os alimentos de maior
peso no orçamento das classes de menor renda.
ALIMENTAÇÃO
E CLASSES DE RENDA FAMILIAR
Devemos
olhar mais de perto a questão da relação entre a renda e o atendimento ao
direito à alimentação (admitindo-se o consumo de quantidade e qualidade diárias
recomendadas pelos nutrólogos e nutricionistas). É importante se examinarem
alguns dos dados de renda e de consumo, coletados pelo IBGE por
meio da “Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio - contínua” e da Pesquisa de
Orçamentos Familiares. Esta, realizada pelo IBGE nos anos de 2017-18, revela as
seguintes informações que merecem ser destacadas aqui:
a)
as classes de renda média familiar consideradas no levantamento foram: até dois
Salários-Mínimos (SM) (R$ 954,00; total de R$ 1.908,00); dois a três SM (R$
2.862,00); quatro a seis SM (R$ 5.724,00); 7 a 10 SM (R$ 9.540,00); 11 a 15 SM
(R$ 14.310,00); 15 a 25 SM (R$ 23.850,00); e mais de 25 SM;
b)
do número total de famílias pesquisadas (5,0 milhões), 2,0 milhões obtinham até
dois Salários-Mínimos e 4,7 milhões, até seis Salários-Mínimos;
c)
apenas 47,2 mil famílias obtinham mais de 25 Salários-Mínimos;
d)
a pesquisa revelou que o tamanho médio da família (pessoas) variou de 3,25 a
3,93;
e)
do ponto de vista da origem dos rendimentos, acrescidos das variações
patrimoniais, importa saber que o rendimento médio familiar foi de R$ 3.647,70,
destacando-se: R$ 2.223,69 de rendimento do trabalho e R$ 594,52 de
transferência (não correspondentes a contrapartida de trabalho, tais como
aposentadorias, pensões, programas sociais federais, entre outros);
f)
ao se examinarem os valores dos rendimentos da classe com ganhos de até dois Salários-Mínimos
mensais, e os daquela com mais de 25 SM, o rendimento médio destas famílias
atinge 29,4 vezes o das primeiras.
Com
relação ao peso da alimentação no orçamento familiar, a pesquisa identificou as
seguintes informações importantes, relativas ao ano de 2018, destacadas aqui:
a)
a participação dos gastos com alimentação no orçamento das famílias com
rendimento de até dois SM era de 22%, enquanto a participação no caso das
famílias com mais de 25 SM era de 7,6%;
b)
essa disparidade de importância da alimentação no orçamento das famílias torna
relevante a alteração do Sistema Tributário Nacional (STN) quanto à tributação
dos alimentos e a observação do comportamento da inflação segundo as categorias
de gastos.
PREÇOS
DA ALIMENTAÇÃO E CLASSES DE RENDA
Os
levantamentos feitos pelo IBGE para a construção do Índice de Preços ao
Consumidor Amplo (famílias até 40 Salários-Mínimos) compreendem 9 grupos de
produtos ou serviços, um dos quais é "Alimentação e Bebidas". Quanto
ao mês de abril de 2022, para o conjunto de nove
Regiões Metropolitanas, o aumento percentual médio dos preços de todos os segmentos
de produtos e serviços foi de 1,06%. No caso do segmento "Alimentação e
Bebidas" o aumento médio foi de 2,06%, tendo variado entre as nove regiões
de 1,08% em Brasília a 2,6% em Belém.
Quanto
à variação dos preços nos últimos 12 meses, a pesquisa do IBGE, que
acrescenta sete municípios aos integrantes das nove regiões metropolitanas da
divulgação mensal, acima mencionada, também detalha os itens de consumo por
grupos de produtos e até produtos isoladamente. Para todos os produtos
pesquisados, a inflação média anual foi de 12,13%. Para o item
"Alimentação e bebidas" a elevação média dos preços foi de 13,47%;
mas, se considerada apenas a alimentação no domicílio, a elevação em 12 meses
chegou a 16,12%.
O
Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (DIEESE)
divulgou o resultado de seus levantamentos e análises, relativas aos preços da
cesta básica, para o mês de abril de 2022. O título da Nota à
Imprensa distribuída em 6 de maio de 2022 afirma: "Pelo segundo mês
consecutivo, valor da cesta básica aumenta em todas as capitais". Destaco
duas passagens no texto de
cinco páginas: "A comparação do valor da cesta em 12 meses, ou seja, entre
abril de 2022 e abril de 2021, mostrou que todas as capitais tiveram alta de
preço, com variações que oscilaram entre 17,07%, em João Pessoa, e 29,93%, em
Campo Grande (p. 1) ... Quando se
compara o custo da cesta e o salário-mínimo líquido, ou seja, após o desconto
de 7,5% referente à Previdência Social, verifica-se que o trabalhador
remunerado pelo piso nacional comprometeu em média, em abril de 2022, 61,00% do
rendimento para adquirir os produtos da cesta, mais do que em março, quando o
percentual foi de 58,57%." (p. 2). Desse modo, fica evidente o impacto da
inflação sobre as camadas de menor renda, diante da participação maior desse
segmento de bens e serviços no consumo das famílias que apenas conseguem essa
baixa renda.
Educação, Saúde, Alimentação, Trabalho, Lazer, Moradia, Transporte, Segurança,
Previdência Social, Proteção à Maternidade e à Infância e Assistência aos
Desamparados.